Solucionar problemas de habitação e moradia da população em situação de vulnerabilidade social pode ser um gargalo de oportunidade para o empreendedor que deseja criar um negócio de impacto social. Só no Brasil, 11,4 milhões de pessoas vivem em favelas, de acordo com o Censo 2010 do IBGE. A precariedade de moradias, o baixo poder econômico de grande parte da população e as dificuldades do governo em atender às demandas abriram espaço para startups desenvolverem negócios rentáveis que conseguem atender pessoas de baixa renda.
Estudo inédito feito pela Artemisia (organização sem fins lucrativos que trabalha no fomento de negócios de impacto social no Brasil) e pela Gerdau, a Tese de Impacto Social em Habitação aponta desafios do setor e mostra que há espaço para que a iniciativa privada consiga empreender e gerar impacto positivo para a população em situação de vulnerabilidade social. “Há mais de dez anos tentamos fomentar inovações e vemos que, historicamente, a habitação sempre foi um tema com menos quantidade de empreendimentos e negócios”, explica Maure Pessanha, diretora executiva da Artemisia e colaboradora do Estadão PME.
A base de dados da Associação Brasileira de Startups (Abstartups) corrobora a tese de Maure. Atualmente, são 143 construtechs e 99 proptechs – startups que atuam em construção civil e imobiliária, respectivamente – associadas à instituição. Entre os 45 setores mapeados para a atuação de startups no Brasil, elas também não têm tanta prioridade: as construtechs aparecem na 18ª posição e as proptechs, na 24ª, enquanto segmentos como educação, finanças e saúde lideram a lista.
Um levantamento elaborado pela Construtech Ventures, primeira fomentadora de startups em construção civil e imobiliária do País, mapeou 500 startups da área no Brasil, divididas em nichos como captação de recursos, gestão da obra e redução e destino de resíduos. Para o economista Bruno Loreto, um dos fundadores da Construtech Ventures e que, neste ano, criou a Terracotta Ventures para investir no setor de construção e mercado imobiliário de startups, o setor é promissor.
“Ainda há muito espaço para a aplicação de soluções de base tecnológica e tem muita oportunidade no setor de impacto social no ambiente construtivo, considerando que o Brasil tem uma grande população em condições não dignas de moradia.”
Se o número de iniciativas já é considerado baixo, o cenário ainda é mais carente para as construtechs e proptechs de impacto social, ou seja, que pretendem solucionar necessidades da população em situação de vulnerabilidade econômica. Na contramão, a demanda é grande: o déficit habitacional cresceu 7% em dez anos e atingiu sete milhões de unidades habitacionais em 2017, segundo levantamento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) em parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV).
Já a Síntese de Indicadores Sociais, do IBGE, apontou que, no mesmo ano, 27 milhões de pessoas (13% da população) viviam em domicílios inadequados. Da população com renda inferior a R$ 406 por mês, 28% tinha ao menos uma inadequação, contra 13% em relação à população em geral.
Para Maure, o desafio do empreendedor é criar um modelo de negócio que atenda de forma acessível o público de baixa renda e seja rentável, já que negócios de impacto social possuem modelos de precificação e objetivos de sustentabilidade financeira e rentabilidade. “O mercado está crescendo, mas ainda é o setor onde mais temos dificuldades para encontrar iniciativas que tenham nascido com essa missão, façam um trabalho sério e gerem lucro”, diz a cofundadora da Artemisia, que desde 2012 realizou sete teses, em áreas como saúde, educação e mobilidade. Até o fim deste ano, é prevista a tese sobre empregabilidade.
Outras oportunidades levantadas pela Tese de Impacto Social em Habitação, desenvolvida pela Artemisia, são as de negócios que propõem a reforma de moradias e criem soluções financeiras para famílias de baixa renda comprarem ou reformarem suas casas. Nesse sentido, os sócios Fernando Assad, Marcelo Coelho e Igiano Lima criaram, em 2014, o Programa Vivenda, negócio social que oferece soluções para famílias de baixa renda acessarem reformas de qualidade.
A startup faz a reforma completa de cômodos – banheiro, cozinha, área de serviço, sala e quarto – passando pela arquitetura do projeto e incluindo a mão de obra, o material, a entrega e o financiamento da obra.
“Nós vimos que não existia solução de financiamento no mercado e lançamos a primeira debênture de impacto social do Brasil que tem como motivação exclusiva financiar as reformas da Vivenda”, explica Fernando.
A startup captou R$ 5 milhões para financiar oito mil reformas. Para as famílias de baixa renda que podem pagar pelo serviço, eles financiam até R$ 11.500, parcelados em até 30 vezes.
Quem não pode arcar com o valor recebe a reforma de graça e ela é paga por fundações e institutos filantrópicos. A startup atende da classe C à classe E, já realizou mais de 1.600 reformas e faturou R$ 2,5 milhões no ano passado.
Fonte: AbrainC
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