Quem tomaria uma decisão de longo prazo no meio de uma pandemia que colocou em dúvida a manutenção dos empregos, mudou o jeito de trabalhar e até de viver? Pode parecer surpreendente, mas milhões de brasileiros estão dando esse passo e contratando crédito imobiliário – cujos prazos vão de 30 a 35 anos – no meio desse cenário nebuloso.
O financiamento habitacional foi a linha que mais cresceu nos balanços de alguns bancos no segundo trimestre. Depois de uma estremecida no fim de março, as concessões já estão acima do patamar que se via no início do ano. Foram liberados em junho R$ 9,27 bilhões, volume que o torna o mês mais aquecido desde janeiro de 2015, conforme dados da Abecip, a associação das instituições financeiras que atuam no segmento. Os dados de julho ainda não foram divulgados, mas as instituições financeiras sinalizam que virão ainda mais fortes.
“Quando a crise começou, foi uma insegurança geral, aquela sensação de desastre iminente. Mas o que se viu foi quase uma recuperação em V”, afirma o diretor de crédito imobiliário do Bradesco, Romero Albuquerque.
A demanda natural por habitação (casamentos, nascimentos, divórcios etc.) e o repensar da moradia provocado pelo isolamento social ajudam, mas nada representa um empurrão tão forte no crédito imobiliário quanto a redução das taxas de juros.
O setor vem trabalhando com contratos em torno de 7% ao ano mais TR (atualmente zerada) ou de até 4,95% ao ano mais IPCA. Em meados de 2017, a taxa média estava acima de 10% ao ano mais TR. Essa diferença incluiu mais 4,5 milhões de famílias, tornando o crédito imobiliário elegível a cerca de 9,3 milhões de famílias, de acordo com o Bradesco.
Cada ponto percentual de queda nas taxas de juros representa um aumento de 8% a 10% na capacidade incremental de pagamentos do cliente. Isso significa não só colocar mais gente para dentro do mercado como também permite que caibam no bolso as parcelas de imóveis maiores e mais caros, diz Sandro Gamba, diretor de negócios imobiliários do Santander. “A taxa de juros mais baixa permite a migração de dinheiro da renda fixa para outros ativos”, afirma.
O executivo aponta ainda outro fator: na pandemia, alguns procedimentos para a contratação de crédito imobiliário foram simplificados, o que acelerou o fechamento das transações.
“Nunca antes nos meus 40 e poucos anos de construção houve um momento macro tão favorável quanto este”, afirmou Rubens Menin, fundador da construtora MRV, em evento do setor na semana passada.
Com 70% do mercado de crédito imobiliário no país, a Caixa dobrou a produção em julho deste ano em relação ao mesmo mês do ano passado. E agosto está 30% mais forte que julho. Além dos juros mais baixos, o presidente do banco, Pedro Guimarães, atribui o crescimento à decisão de conceder aos clientes carência de seis meses no pagamento das parcelas. “Muitas pessoas que estavam na dúvida resolveram comprar”, afirma.
Fonte: Valor Econômico
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